Jan 31, 2007

A persistência da memória


Algumas sensações são difíceis de explicar. Mesmo para quem, de certa forma, desde que se conhece por gente, vive a explicar sensações próprias e dos outros. Estou minúsculo, guardei profundamente meu amor apaixonado para que ele não se perca (ou nós). Em contrapartida, tenho mantido a mais verídica sensação amorosa por todas as pessoas e coisas. É ótimo, alguém poderia arriscar, mas tenho tido a exata sensação de que estas coisas, estas a que nos acostumamos, que nos cercam, nos definem o real com seus contornos, todas estas, valem bem pouco e o que nos deve importar realmente é vivermos inteiramente no amor. Acima de religiosidades, teóricas ou práticas, há a obrigatoriedade do bem a que tenho me cumprido. Talvez seja altruísmo demais desfazer-me para que isso valha, mas tenho me quisto tão menos do que a qualquer coisa. Prefiro diluir-me em algo com importância a permanecer indivíduo. Espero resistir ao processo sem perder-me. Fica um poema despretensioso, mínimo em forças poéticas.


Antes que eu pegue a estrada

antes que eu pegue a estrada
meu amor guarda
meu coração numa caixa
sinuosa
para não ter poeira

antes que possa ser taxado
de coração viajante

meu amor se adiante
guarda
meu coração largamente

é que mesmo medroso
como ele só medroso
medroso
de não sair de casa
meu coração espia curioso
antes
por onde minhas pernas vão

e gosta de por os olhos
na beira acima da caixa
onde tudo é perigoso
à surpresa das paisagens
onde a soma dos altos dos vales
da linha inalcançável
nunca ninguém guarda

antes meu amor que ele caia
ávido na terra seca
despenque
guarda direito a minha caixa
que treme imperfeita
dentro da tua

guarda com teus olhos
os olhos que meu coração
não tem
pousa tua mão e teu cuidado
em sua musculatura
insinuante de estrada
antes que eu pegue a estrada
e marque a estrada
com ele

guarda


p.s.: perdoem-me a falta de espacialidade nos versos a que o blog me obriga.

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