Nov 9, 2008

O isso

Interpelado uma vez pela Flam, "não venha me dizer que é prosa... é poema, é poema", senti um déja vu, que salvo o sonho de Brás, está entre as retrospectivas mais imagéticas que se tem notícia. Há muito me falam, todos com razão, que meus contos são mais poemas do que contos. Respondo, sem discordar, que depende em quem se escora. Se a epígrafe é Baudelaire, poema, se Trevisan, prosa. A síntese vem talvez de algo que me disse o Alfredo Aquino sobre a pluralidade de sua arte: a matéria é a mesma, não há dificuldade. Bom, está dito, segue o isso.

o homem

Parecia uma velha comum. Era uma velha comum, no ponto em que todas as velhas são comuns e únicas. Do primeiro, supomos sua saia de pano à boca das canelas, sua blusa de flores esfolheadas, suas mãos indecisas entre ficar e ir. Ver é a forma mais tênue de supor. A maneira com que se movimenta toda noite em frente a uma casa célebre do centro da cidade e um poodle amarronzado que traz nos braços eram traços que ela não compartilhava. Como nunca se mexe, supomos que a cadela se chama Inês. Gerações têm contado aos jovens, mesmo se não a viram realmente, suas aparições e seus perigos. Há quanto tempo caminha como se a ninar a morte? Por que não a afugentam ou recolhem ou entendem? Ela, sabiamente alheia ao material do mundo, segue sua existência perfeita de ser a imagem do conto à imagem do conto.

2 comments:

Alice Sant'Anna said...

oi, guto! obrigada pelo comentário no blog. também adoro a adília aqui embaixo. :)

Anonymous said...

Ver é a forma mais tênue de supor.

gostei pra caralho.

ahhh tava bacana a função no beco, né?

pena eu não ter podido ficar.... tinha um casamento que já tava acontecendo no momento em que eu estava no palco. hehe

e no fim, leram mais dos de amor.

bacana!! hehe

bração, camarada.