Sep 12, 2008

As damas da noite

Nunca fui a uma casa de prostituição! Soa ridículo, eu sei, até às avessas, neste tempo pós rock, um suposto artista afirmar isso de maneira tão categórica. Talvez até me recriminem de não ter me esbaldado em minha juventude, mas nunca lidei bem com a idéia de comunhão lúbrica e objetal das mulheres. Nunca achei razoável tratar mulher ou homem como produto, então nada mais esperado do que esta repulsa às casas de amor comum.

Talvez devesse mudar de idéia. Estou realmente muito cansado de tudo. Salvo raríssimas pessoas (uso a ressalva para eventuais interpelações de leitores, ao que responderei "não, não, você era uma daquelas pessoas da ressalva"), os demais me tratam da mesma forma com que me recuso a tratar as funcionárias do meretrício. Por extensão à arte, que deve entreter, faço o mesmo. A superfície do meu lirismo toca a face, cora as pessoas, elas se alegram, tudo muito fácil; mas os sentidos menos evidentes e temporários permanecem intocáveis porque não encantam, não amenizam as pessoas do fardo de suas consciências. Sou exatamente como aquele profissional que acaba de atender a uma dama do Itaim, infeliz com o marido, e que mostrou todo o glamour em seu serviço. Contudo, descerá a pé, com certeza sozinho, pelo caminho mais curto e barato rumo a um bairro distante ou a um próximo trabalho.

Vende-se minha moral anacrônica para poder dormir com putas!

as damas da noite

as damas da noite são biscoitos
do forno das flores
ditam pelo cheiro
a abstenção de sentidos

um tempo depois do fogo
das cores ao alto das hastes
da laje feita de pedra
por um azul macio

imersos no esquecimento
de seu pólen de baunilha
deixamos nossos desejos
no máximo alcance dos braços

viver ínfimos na memória
de um tempo que construímos
arrancá-lo de onde se mostra
ou se esconde para agora

é o jardim amadeirado
a falsa promessa do aroma
morrer que seja nas flores
ainda quentes da gula

6 comments:

FlaM said...

Ele voltou! Que bom!
Lindo, lindo, lindíssimo poema!
Irias ficar admirado com a quantidade de homens que nunca esteve com uma profissional. Decididamente não estás solitário nessa situação, essa é uma fantasia de muitos homens (achar que todos já foram, menos eles).
Agora quanto ao que há entre nós, decididamente não é só sexo! Não gostei nada dessa insinuação, meu caro poeta! Comparar-nos com sexo banal e barato! O que existe entre nós, caro Guto Leite, é AMOR... amor de alma!
bjs, f
(Nem ouse me acenar com o saco das ressalvas! Só aceito "eu te amo"!)

Anonymous said...

Te digo uma coisa. Não é nada fácil comentar este blog (o único de comento)... Não se fala de amenidades, e mesmo qnd o assunto parece simples, n tem a abordagem mais óbvia.
Bom, nunca pensei q n frequentar casas de alterne fosse excepção. E considerando q n quero ficar sozinha pra sempre, n volto a pensar nesse assunto. Tenho nojo de quem se dispõe a pagar por um corpo. Sabe? Chama-se corpo uma pessoa sem alma, morta. Dormir com um corpo beira o assassinato ou a necrofilia. Mas tlz tou a ser exagerada. Uma coisa eu sei. A capacidade de nos mantermos fiéis às nossas idéias sempre é recompensada. Qnd nos comportamos contra o q acreditamos ser certo, só pra nos adequarmos, por comodismo, ou sei lá mais o q, o preço, no mínimo, é a vergonha e a sensação de auto-mutilação.
Sobre o texto. Não sei se entendi, mas o q senti foi como um imenso eco numa sala cheia de coisas (o que, teoricamente é impossível). Ou seja, fica a idéia de que mesmo com mil acessórios, falta o essencial, e portanto permanece o vazio. Daí vem o eco.
É isso?

FlaM said...

vim só para passar uma vassoura e tirar o pó! ô lugarzinho abandonado!

Isaac Frederico said...

aloha guto !
soberbo poema - e soberbíssima análise pré-poema !
passo um tempo fora e, ao retorno, encontro a mesma pena afiada de sempre.
abraços campanha !

Rachel Souza said...

Interessante! Volto mais tarde, gostei daqui.

FlaM said...

BUAAAHHH! cadê vc?! Garanto que se perdeu com alguma vagabunda!!!...
BUAAAHHH!