Antes da crônica em si, gostaria de agracer muito os comentários a respeito do conto passado. Estímulos, acertos, leituras. Tudo perfeito para meu desenvolvimento aprendiz.
A vida é uma sucessão intermitente de encontros fortuitos. Assim, desde os nossos primeiros anos, vamos encontrando pessoas, coisas, lugares, sensações e pensamentos. Muitos destes nos acompanharão por muito tempo. Outros virão de relance e, de súbito, se esmaecerão junto ao corpo, deixando-se no breve. Nosso espírito, cobiçoso em reunir tudo o que pode em torno de si, esforça-se para se recordar ao máximo de cada estímulo e, ao fruto deste esforço, damos o nome de memória.
Aí é que está a saudade. Saudade é a angústia pela impossibilidade imediata de trazermos ao presente, desta espécie de relicário construído por nosso espírito, aquilo do qual não somos capazes de prescindir. Tanto é assim, que ela só dura enquanto durar essa impossibilidade. Nas vésperas de se reencontrar o elemento saudoso, os demais sentimentos, geralmente eufóricos, tomam o lugar da saudade, mesmo que igualmente nos desatrelem o peito. Em casos crônicos, torna-se possível sentirmos, até mesmo, imensas saudades assim que nos despedimos do ente saudoso, antevendo a angústia que nos importunará até o longínquo reencontro.
Há uma e somente uma forma de lidar com este sentimento traiçoeiro. Palavra de viajante que mais ano, menos ano, desloca-se por grandes espaços de terras, despedindo-se de fontes generosas de saudades. É necessário que busquemos, aos primeiros sinais do importuno, um número considerável de novas pessoas e coisas, lugares e pensamentos inéditos, sensações recém saídas do forno, para que possamos entulhar o cômodo tão valorizado por nosso espírito. Saudades definitivamente só se matam afogadas.
Obviamente, após algum tempo, o depósito de nossa memória será reorganizado e nos será possível, e obrigatório, voltar a sentir saudades dos entes sublimados, mas estas serão brandas e virão em lufadas aparentemente inexplicáveis de suas relações atuais. Também obviamente, você estará condenado a cada vez mais aumentar o âmbito em que agem suas saudades e pode acabar, infelizmente, sufocando a si mesmo na impossibilidade de reconstruir-se em cada relação que abandonou ao longo do tempo.
Bom, já que é impossível nos livrarmos de tais destemperos, não convém, assim, revelarmos todo o seu mecanismo e, acreditem, há sentimentos muito mais traiçoeiros e inevitavelmente catastróficos. Deviam agradecer por eu não ter escrito estas linhas sobre o amor.
Mar 29, 2008
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3 comments:
meu caro, alem de eximio poeta e contista, mostrando-se um verdadeiro cirurgiao do espirito! aos poucos vou ficando com medo de acessar o blog, porque a carga pode ser por demais precisa e por demais devasadora - imagina se o texto fosse sobre amor !
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convem lembrar: ca no oriente o merito esta justamente em esfriar as paixoes, esfriar os sentimentos, a fuga dos extremos emocionais.
como estariamos nos inseridos nesse modelo ??
seriamos parias, por certo, coisa que ja somos por sermos poetas.
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abracos do cambodja !
E as MINHAS saudades de você,como é que eu faço? Acho q não tem mais nada novo ´prá eu me distrair por aqui... hehehe
Bjinho, boa semana (amanhã entrego meu TCC, boa sorte prá mim)
=)
Vim à procura de conforto, pq é justamente a saudade que me sufoca agora, e no fim encontrei um espelho...
Saudades verdadeiras criam raízes e incoporam-se no Eu. Nunca vou deixar de ter saudades do meu pai e da minha irmã. Nem qnd estou c eles deixo de ter saudades, pq sinto falta daquilo que n vivi ao lado deles. Isso me mata um pouquinho, mas me mostra q estou viva e cheia de sentimentos.
A pior saudade é a saudade do q n se viveu. Essa sim vem com angústia. A angústia da incerteza. Hj sou toda angústia.
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